Em 03/02/2013 às 09h00 | Atualizado em 27/07/2018 às 17h22

Pesquisa abre caminho para tratamento da miocardite induzida por doença de Chagas

Mosquito transmissor da doença de Chagas

Mosquito transmissor da doença de Chagas

Download

 

Por Karina Toledo

Agência FAPESP – Uma das sequelas mais graves da doença de Chagas é a cardiopatia decorrente de uma inflamação crônica no músculo do coração – a miocardite –, que destrói o órgão lentamente. Pesquisa recém-concluída na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (FMRP-USP), ajudou a compreender melhor a participação do sistema imunológico nesse processo, abrindo caminho para novos tratamentos.

Segundo os resultados divulgados em dezembro na revista PLoS Neglected Tropical Diseases, dois tipos de linfócitos – as células T reguladoras (Treg) e as células T auxiliares ou “helpers” 17 (Th17) – são os principais responsáveis por modular a intensidade do ataque ao parasita causador da doença: o Trypanosoma cruzi.

Quando esses linfócitos estão diminuídos no organismo do hospedeiro, o ataque ao T. cruzi é mais intenso e, consequentemente, a agressão do próprio sistema imunológico ao coração também é maior. Já os portadores de doença de Chagas com maiores quantidades de Treg e de Th17 circulantes apresentam melhor prognóstico e um quadro assintomático na fase crônica da doença.

“Em camundongos infectados por T. cruzi, mostramos que, se o funcionamento dessas células é inibido, o animal morre em decorrência da miocardite. Mas quando a atuação dessas células está exacerbada também é ruim, pois o organismo não consegue controlar a multiplicação dos parasitas. Essas células são necessárias, mas na quantidade certa”, explicou João Santana Silva, professor da FMRP-USP e coordenador da pesquisa apoiada pela FAPESP.

Posteriormente, com base na análise de amostras de sangue de pacientes com doença de Chagas, os cientistas viram que também em humanos há uma relação clara entre a quantidade de Treg e de Th17 circulante e a gravidade da miocardite.

“Com base nesse conhecimento, é possível predizer quais pacientes assintomáticos são mais suscetíveis a desenvolver cardiopatia. A descoberta também abre caminho para o desenvolvimento de medicamentos capazes de aumentar a produção de Treg e Th17 e modular a resposta imunológica”, disse.

A doença de Chagas é a principal causa de miocardite. Segundo dados da Fiocruz, estima-se que haja aproximadamente 20 milhões de pacientes infectados na América Latina. Entre 25% e 35% devem desenvolver alterações cardiovasculares.

De acordo com Silva, acreditava-se no passado que não havia necessidade de tratar chagásicos assintomáticos, pois a principal droga usada contra o parasita – o benzonidazol – causa fortes efeitos colaterais e é contraindicada em muitos casos. Além disso, os benefícios do tratamento não estavam bem definidos.

Estudos recentes, no entanto, mostram que todos os portadores de Chagas evoluem, mesmo que muito lentamente, para a cardiopatia. “A velocidade do processo degenerativo vai depender da produção de células Treg e Th17”, explicou Silva.

Essas células, assim como os demais linfócitos, são produzidas na medula óssea e compõem o grupo dos chamados glóbulos brancos. “Até pouco tempo atrás, eram conhecidos apenas dois tipos de células T auxiliares: a Th1 e a Th2. Recentemente foi descoberta a existência de vários outros tipos, sendo os mais importantes Treg e Th17. Quando o Projeto Temático começou, pouco se sabia sobre o papel dessas células recém-descobertas”, disse Silva.

Depois de ativadas pelo contato com o patógeno, explicou o pesquisador, as células T auxiliares produzem uma série de mediadores que ativam outros tipos de leucócitos e disparam a resposta imunológica específica contra o antígeno.

“As células Th17 estão envolvidas em doenças autoimunes, como artrite e diabetes. Por isso, acreditava-se que a presença delas no organismo estava relacionada com um mau prognóstico. Em nossa pesquisa, porém, vimos que, na infecção por T. cruzi e na leishmaniose, ela é benigna. Atua em parceria com a Treg para frear a resposta imunológica prejudicial”, afirmou Silva.

A produção de Treg e de Th17 pode ser influenciada por fatores genéticos, doenças prévias, alimentação e pela microbiota intestinal, explicou Silva. No caso da doença de Chagas, a interação com o parasita também é fator determinante. “Em camundongos vimos que algumas linhagens do parasita estimulam mais a produção dessas células. Isso é determinado logo no início da infecção”, disse.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE






Todos os direitos reservados a Marcelo Lopes - www.marcelolopes.jor.br
Proibida cópia de conteúdo e imagens sem prévia autorização!
  • Faça Parte!

desenvolvido por: